Hemidactylus turcicus

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Citation:
Mateus, O., & Jacinto J. (2008).  Hemidactylus turcicus. Atlas dos Anfíbios e Répteis de Portugal. 130-131., Lisboa: A. Loureiro, N. Ferrand de Almeida, M.A. Carretero, O.S. Paulo. Instituto da Conservação da Natureza e da Biodiversidade

Hemidactylus turcicus (Linnaeus, 1758)

Osga-turca

Salamanquesa rosada

Turkish gecko

 

TAXONOMIA/FILOGEOGRAFIA

O género Hemidactylus Oken, 1817, é aquele que apresenta maior diversidade no seio da família Gekkonidae, com cerca de 75 espécies reconhecidas em 1991 (Kluge, 1991). Em Portugal, Hemidactylus turcicus é representada pela sub-espécie H. t. turcicus [Linnaeus, 1758] (Caetano et al., 1976). Um estudo recente baseado na análise da variação da molécula de DNA-mitocondrial descreve as populações que ocorremem toda a Bacia Mediterrânica Ocidental como muito homogéneas, indicando a sua possível origem a partir de populações mais orientais (Carranza & Arnold, 2006). Segundo os mesmos autores, a falta de fósseis em regiões mediterrânicas sugere uma rápida dispersão com influência antropogénica.

 

DistribuiçÃo global

O género Hemidactylus é um dos géneros de répteis com maior distribuição mundial, e a espécie H. turcicus pode encontrar-se em toda a região costeira do mar Mediterrâneo (incluindo a Península Ibérica) e do mar Vermelho, estendendo-se a sua distribuição para leste, até ao Paquistão e Índia, e para sul, até ao Quénia. Foi introduzida em vários países do continente americano, nomeadamente na América do Norte (Estados Unidos da América, México), América Central, Antilhas e Caraíbas, incluindo Cuba, e na América do Sul (Etheridge, 1952; Bruno et al., 1973; Engelmann et al., 1986; Fretey, 1987; Selcer, 1987; Duellman & Pianka, 1990; Barbadillo et al., 1999). Ocorre, sobretudo, em áreas costeiras quentes e em regiões secas do interior (Barbadillo, 1987; Fretey, 1987; Delauguerre & Cheylan, 1992; Barbadillo et al., 1999). De acordo com vários autores, H. turcicus está muito associada a áreas urbanas e rurais (por exemplo, Crespo & Oliveira, 1989; Geniez, 1989; Escriba et al., 1999; Luiselli & Capizzi, 1999; Ferrand de Almeida et al., 2001). No entanto, nem sempre esta situação é a dominante [ver Garcia & Garcia (1992) e Delauguerre & Cheylan (1992)]. A maior parte dos estudos realizados sobre esta espécie foi efectuada em habitats urbanos e/ou rurais, o que poderá contribuir para acentuar inadequadamente a sua preferência antrópica. Ocorre em locais pedregosos como rochedos, paredes, muros de pedra, ruínas, casas habitadas, mas também em troncos e outros abrigos. Barbadillo et al. (1999) referem 300 m como a altitude máxima a que H. turcicus pode ser encontrada. No entanto, Geniez (1989) menciona vários autores que registaram a sua presença a 700 m (Serra Nevada, Espanha), a 800 m (Sicília, Itália) e a 1100 m (Abruzos, Itália), enquanto Trujillo et al. (1995) observaram-na a 1049 m de altitude, nas Ilhas Canárias, e Garcia & Garcia (1992) registaram H. t. turcicus a 870 m – altitude máxima a que esta espécie foi encontrada na Península Ibérica. Delauguerre & Cheylan (1992) descrevem que 92% das observações desta espécie se localizaram a altitudes inferiores a 100 m, num estudo efectuado na Córsega (França). É uma espécie com actividade quase estritamente crepuscular ou nocturna. Excepcionalmente, pode exibir actividade diurna, mas apenas nas estações mais temperadas ou frias (Barbadillo, 1987; Fretey, 1987; Branch, 1996; Barbadillo et al., 1999; Ferrand de Almeida et al., 2001; Jacinto, 2002a; Mateus & Jacinto, 2002).

 

Distribuição NACIONAL

A distribuição conhecida desta espécie em Portugal está restrita ao sul: Algarve (nomeadamente na região litoral e vale do rio Guadiana) e Alentejo (algumas regiões do interior alentejano). A ocorrência mais setentrional foi registada no concelho de Elvas (Godinho et al., 1999; Jacinto & Mateus, 2002).. Distribui-se desde o nível do mar até aos 400 m de altitude, na Serra de Monchique, embora seja mais frequente entre os 100 e 200m (Malkmus, 1995). No nosso país, a população de osgas mais estudada corresponde à existente na cidade de Évora (Mateus, 1996; Jacinto, 2002a, b, c; Jacinto & Crespo, 2002; Mateus & Jacinto, 2002). Esta cidade possui a particularidade de apresentar a ocorrência das duas espécies de osgas existentes em Portugal Continental, H. turcicus e T. mauritanica, não podendo deixar de se salientar a grande frequência da primeira (Jacinto & Crespo, 2002; Jacinto, 2002b). Em Évora, H. turcicus possui uma actividade essencialmente crepuscular e nocturna, com um pico de actividade cerca das 02h00 UTC, sendo mais activa no Verão, especialmente no mês de Setembro (Jacinto, 2002a; Mateus & Jacinto, 2002).

 

CONSERVAÇÃO E AMEAÇAS

Existe uma significativa escassez de informação biológica sobre H. turcicus devido, em parte, às suas características ecológicas e comportamentais (actividade quase estritamente crepuscular ou nocturna, e comportamento discreto). Como tal, torna-se prioritário o desenvolvimento de um maior número de estudos, especialmente de distribuição, abundância, estrutura populacional e identificação de ameaças, de modo a colmatar as actuais lacunas de conhecimento. Em termos gerais, as osgas estão associadas a muitas superstições e crenças, como poderem ser venenosas ou capazes de uma mordedura fatal. Embora tais crenças sejam infundadas, em algumas regiões são temidas e mortas por essas razões (Barbadillo, 1987; Pough et al., 1998), nomeadamente em Portugal (Pargana et al., 1996; Ferrand de Almeida et al., 2001). Uma vez que H. turcicus ocorre normalmente em associação com ambientes antrópicos, dever-se-ão efectuar campanhas de sensibilização e de educação ambiental especialmente dirigidas às populações das áreas urbanas e rurais onde se tem conhecimento da sua existência.

 

REFERÊNCIAS

 

Branch, B. (1996): Field Guide to the snakes and other reptiles of Southern Africa. Struik Publ. Cape Town,South Africa. 328 pp.

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